quarta-feira, 1 de setembro de 2010

A INDEPENDÊNCIA DO KOSOVO

A independência do Kosovo não surpreende nem deve deixar ninguém surpreendido. Mesmo que tenha sido unilateral.

Todas as independências são unilaterais e quando não são – o que é raro – é porque uma das partes obrigou a outra.

De facto a independência de qualquer país faz-se, por norma, através da violência e pela força das armas. A nossa também foi assim.

As independências geram, porém, conivências e antagonismos. E todas têm consequências. É sobre estas que é preciso meditar.

O Direito Internacional é nestes casos, uma falácia: costuma dar argumentos a todas as partes envolvidas e está refém dos interesses das grandes potências. Aliás, o caso do envolvimento da NATO nos Balcãs é disto um exemplo selecto: mesmo estando fora do espírito e da forma do articulado, interveio – por pressão americana -, e só depois se legitimou, mudando o seu artigo V, na cimeira de Washington, comemorativa do 50º Aniversário do Tratado. Ou seja vai mudando conforme os “ventos da História”. Nós Portugueses deveríamos meditar nisto… Até porque a memória dos povos é curta!...

A independência do Kosovo serve os interesses dos EUA. A curto prazo, depois se verá (o governo americano tem aliás, criado o curioso hábito de ir ajudar, quem a seguir vão atacar…). Antagoniza a Rússia, aliada da Sérvia; namora os países muçulmanos (a maioria da população albanesa está islamizada) e implanta um nó górdio no quintal da União Europeia (UE).

Esta, como não tem Exército, Política Externa, e cada um puxa para seu lado, está aflita sem saber o que fazer. Vamos ter aqui pano para mangas e para muito tempo. Cada país está por si.

Acresce que existe uma resolução do Conselho de Segurança da ONU, que mantém o Kosovo como parte integrante da Sérvia e ainda o facto da independência ser declarada quando existem cerca de 17000 soldados da NATO (e de outros países, num total de 30!), a ocuparem o Kosovo, com mandato das Nações Unidas!

Como é que isto é possível? E durante quanto tempo mais é que vão ficar lá as tropas? E o que vai acontecer quando saírem? Será que estão a pensar instaurar um protectorado?

O governo português safou-se por uma unha negra de ter que lidar com este problema, durante a sua presidência da União, mas vai ter que se posicionar de alguma forma neste assunto complexo.

Quanto mais não seja por termos tido e ainda termos tropas portuguesas naquele território, e que não saíram a tempo…

Ora tudo isto vai abrir um “saco de gatos” e pode multiplicar o número de “tribos” e regiões que se queiram independentizar, pelo mundo inteiro.

Portugal seria o país na Europa e no Mundo que teria menos a temer com semelhante ameaça.Mas, como por via da Descolonização traumática e desastrosa que realizámos em 74/75; as autonomias que desenvolvemos, como mal menor e as surgências idiotas de regionalismos que se permitiu fomentar, deixámos de estar imunes ao fenómeno. Quebrou-se a nossa coerência e prevalência política e doutrinária!

Imagino que o governo português entenda tudo isto como “mais uma maçada”. Porquê?

Porque os políticos em Portugal, acham, vai aí para 30 anos, que tudo no mundo ia correr bem para nós, que íamos ser amigos de todos e todos iam ser nossos amigos. Acreditaram que ameaças eram coisas do passado e que as organizações internacionais de defesa, resolviam tudo por nós. Apesar de passarmos a ter pouco Poder, entretivemo-nos a desbaratá-lo ainda mais. Ninguém está interessado em minorar vulnerabilidades e em potenciar capacidades.

Mais, não sabem nem querem saber, como se usa o Poder. E não aparentam ter coragem sequer para o utilizar. Por isso alienam soberania; agacham-se julgando-se espertos; desmantelam o aparelho militar e transformam a diplomacia num quase exercício de relações internacionais. Tudo se resume em 10% de substância e 90% de fotografia para os jornais!

Agora vamos ter uma crise séria entre mãos e não estando na linha da frente da insegurança, podemos levar com estilhaços. Se o governo português tendesse a defender princípios eu arriscaria a dizer que não reconheceria a independência (será certamente pressionado pelo governo espanhol para alinhar a seu lado), alegando-se as graves dúvidas existentes a nível do Direito Internacional e a fraca linearidade do processo. Mas pensamos que irá ganhar tempo (o que já está a fazer), passar despercebido no meio da multidão e caír para o lado da maioria com frases de circunstância, lá mais para a frente.

Mas seria avisado que nos fossemos preparando para a bulha, porque com esta crise ou com outra, será uma questão de tempo.

A generalidade dos lideres políticos europeus aburguesou-se no pior sentido do termo. À custa de engordarem o corpo criaram adiposidade no espírito e deixaram fenecer a alma no coração.

E já nem recordam que Roma afinal caiu, por “excesso de camas fofas e banhos quentes”.

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