14/03/2010
“Com muitos padres nossos e pelouros, a eles nos fomos, e matámo-los a todos, num credo”Fernão Mendes Pinto (in “Peregrinação”, descrevendo um ataque a piratas chineses)
Grupo de piratas capturado pela fragata Álvares Cabral |
Outros pontos do globo sensíveis ao recrudescimento desta prática ancestral, são o Golfo da Guiné e a Costa da Nigéria, o Estreito de Malaca, as ilhas indonésias e algumas àreas da América Central e Sul, banhadas pelo Pacifico.
O painel de oradores, mostrou-se competente em elucidar a assistencia na explicitação,enquadramento e forma de actuação,do fenómeno e seus intervenientes.
De tudo o que ouvimos,guardámos umas sinteses de “conhecimento”e são essas sinteses e alguns comentários, que pretendemos partilhar com os leitores.
A primeira constatação que fazemos é a da dificuldade em arranjar uma definição de “pirataria”, que satisfaça todos. Para o caso vertente não nos vamos preocupar com isso, dado que qualquer leitor intui, sobre o que tratamos…
Sobre as razões que levam a este aumento de pirataria no século XXI, depois de ter sido quase extirpada no princípio do século XIX – quero aqui lembrar que o início da pirataria moderna tanto aérea como naval, nasceu, quanto a nós, com o desvio do paquete Santa Maria e do Super Constelation da TAP, em 1961.
Também não há conclusões seguras: falou-se na existência de estados falhados; na falta de meios de muitos estados para exercerem o controle adequado das suas costas e mares adjacentes; na existência de alguma interferência islâmica no âmbito dos eventos ocorridos pós 11 de Setembro, em Nova Iorque; no vazio ocasionado pela retirada de grandes quantidades de meios navais, dos oceanos, derivado do fim da Guerra Fria; na incapacidade de certas populações ribeirinhas se dedicarem à pesca artesanal (por via da poluição, pesca ilegal alheia, etc.).
O surto de pirataria seria, ainda, favorecido pelo aumento do comércio mundial, pela dificuldade em exercer vigilância; pela falta de medidas coercivas eficazes e pelos lucros obtidos nos actos ilícitos cometidos. Ora o lucro tem compensado largamente o risco. E a fraqueza dos poderes políticos que têm negociado com os piratas, só tem ajudado a estes se mostrarem cada vez mais audazes – acrescentamos nós.
Ora isto, além de pôr em risco vidas e bens, tem passado a afectar a navegação de uma parte cada vez maior dos 53000 navios mercantes existentes no mundo – dos quais apenas uma ridícula parte (13!) ostenta o pavilhão português –, com pesados custos derivados do aumento do preço dos seguros, desvio de rotas (o que aumenta muito o consumo de combustível), diminuição do número de fretes por navio e pagamento de suplemento de risco às guarnições.
Mais cedo do que tarde, estes custos irão reflectir-se no preço que os consumidores irão desembolsar, pelos produtos que adquirirem.
Ora face a tudo isto o que é que a comunidade internacional – coisa que ninguém sabe definir muito bem o que é – e, sobretudo, os países, que têm feito? Pois, têm discutido alguma coisa e enviado navios e aeronaves, para as zonas mais problemáticas, a mais mediática das quais, tem sido o Corno de África.
A vigilância faz-se aqui numa zona que tem 1 milhão e 750 mil milhas quadradas, onde a NATO e a UE dispõe de cerca de 40 navios. O que, apropriadamente, se pode chamar “uma gota de água no oceano”.
De tudo o que foi dado ouvir pelos especialistas presentes sumariza-se o seguinte: existência de uma indefinição política, crónica, sobre o que fazer e como actuar, o que resulta numa falha de objectivos claros a serem atingidos; subsequente falta de clarificação estratégica, até porque muitos dos meios navais presentes, nada têm a ver com o combate à pirataria mas com cenários geopolíticos em desenvolvimento (destinam-se a pré posicionamento, ocupação de vácuos estratégicos, vigilância de eventuais inimigos, etc.).
Chega-se depois à conclusão que a legislação internacional e nacional dos estados, é insuficiente, omissa e muito permissiva (a última lei internacional que versa o tema é a Convenção Internacional do Mar, de Montego Bay, de 1982) para lidar com o fenómeno. Não há esperanças de mudanças rápidas e substanciais, apesar das denúncias e pedidos já efectuados nesse sentido, sobretudo pelos agentes directamente afectados ou empenhados neste âmbito.
Em termos de actuação táctica o desastre consubstancia-se: ninguém quer usar a violência e não há jurisprudência para julgar os infractores. Pelos vistos também não há muita vontade em dar outros passos, dados os custos, maçadas e riscos envolvidos (já imaginaram o que seria julgar os amigos do alheio a bordo, ou trazê-los para Lisboa?).
Deste modo as forças navais cujas regras de empenhamento deixam muito a desejar e constituem um risco acrescido para os intervenientes – quando prendem presumíveis (tem de dizer-se assim!...) piratas, têm de os libertar – obviamente bem tratados e, calhando, com uma palmadinha nas costas – por via da legislação que não há, ao passo que lhes “requisitam” amigavelmente as armas (instrumentos de trabalho!), baseando-se, ao que parece, nas mesmas leis inexistentes.
Ou seja, ninguém sabe como agir, numa situação de risco e ameaça efectiva, parecendo que a única coisa que se tenta fazer é utilizar os meios navais para exercer alguma dissuasão e manter a ameaça em termos de baixa intensidade.
A questão é que, a manter-se este faz de conta”, o problema pode-se agravar, além do que custa os olhos da cara ao contribuinte manter navios e aeronaves no outro lado do mundo, com medíocres resultados, arriscando-se a vida das guarnições para não se sabe muito bem o quê. Quando morrer alguém, veremos como vão justificar o caso…
Vejam como a descrição do grande escritor/aventureiro F. Mendes Pinto, que encima o texto, representa um objectivo ao mesmo tempo político/estratégico e táctico, claro, preciso e conciso!
Justamente o que, à cabeça e adornado da coragem, falta nos dias de hoje.
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