terça-feira, 12 de outubro de 2010

“O ÊXODO” DOS PILOTOS DA FORÇA AÉREA

“Desde os mesteres mais humildes até ao mais sublime, avançar de cara alegre direito à morte, tudo faz, porque todo o trabalho despido de interesse pessoal entra nos deveres da profissão. Trabalho gratuito sempre porque o vencimento de militar, seja pret,soldo ou lista civil, nunca é a remuneração do serviço por não haver dinheiro que pague o sacrifício da vida”.
Mouzinho de Albuquerque in,”Carta ao Príncipe D. Luís Filipe”

Doze F16  da força aérea Portuguesa alinhados na placa do aeroporto do Porto Santo
            O tema da saída dos pilotos militares a meio da sua carreira (agora em qualquer altura da sua carreira …), para as companhias civis de aviação, é recorrente na sociedade portuguesa, como já o foi e ainda é nos países ocidentais, e também um pouco por todo o mundo. Cada caso é, porém, um caso.
            Já escrevemos várias vezes sobre este assunto, tanto artigos de opinião como em documentos de serviço. Há anos que tudo isto se arrasta sem nunca ninguém ter feito nada de sério para o resolver ou atenuar.
            Os chefes militares para actuarem sobre este assunto (não pode ser só o da Força Aérea) têm que partir, creio, de três premissas:
            - os políticos estão-se borrifando para o mesmo;
            - as empresas do meio, não estão interessadas em colaborar em nada;
- o politicamente correcto e o estado das leis, tende a valorizar os “direitos” (desejos) individuais em detrimento das necessidades colectivas.
            Bom, o estado actual das coisas é de ruptura. A Força Aérea em pilotos, já quase só tem tenentes, coronéis e generais. E um dia destes nem nestes últimos postos, vai ter.
            Havendo agora mais uma perspectiva de saída de pilotos (uma “mina” para as empresas civis!), surgiu a ideia, várias vezes ensaiada, de aumentar substancialmente o subsídio de risco de voo que já é pago e que para o vulgo ter uma ideia, representa uma média de cem contos a mais no vencimento, relativamente aos postos equivalentes dos outros militares.
            Ora isto, que representa a maneira mais fácil de olhar para o problema, é um disparate e um erro (como é o de querer tirar o existente ..). Em primeiro lugar porque a discriminação positiva (é o caso), também deve ter limites. E se for difícil encontrar baias regulamentares, que se use o bom senso… Tal facto irá gerar situações de injustiça – logo de conflito -, no seio da FA, com o pessoal das outras especialidades e ainda com o Exército e a Armada. E diga-se que com razão. Esta conflitualidade seria grave e ninguém sabe, honestamente, calcular ao que poderia levar e seus custos.
            Além disto, vivemos num momento em que o que se torna necessário é unir esforços para se aumentar o vencimento base de todos de modo a atenuar o espartilho financeiro que há anos tem sido imposto à família militar.
            Finalmente é um erro, porque não se iria resolver coisa alguma pela simples razão que por maior que fosse o aumento do “risco de voo”, tal nunca chegaria ao que ganha um piloto civil nomeadamente nas companhias mais apetecidas.
            Além disso o problema que afecta os pilotos da FA, como a generalidade dos militares, está longe se de esgotar no vil metal.
            A situação é complexa e exige um tratamento em várias “frentes” e requer medidas “positivas” e não negativas, como tem sido timbre na FA: por exemplo,mudança constante de procedimentos; aumento do tempo de serviço para se poder sair e das indemnizações a pagar.
Passam em termos gerais por:
1 - harmonização por parte do Estado dos salários e “outras condições”, que paga aos funcionários equivalentes nas empresas públicas, cujo expoente para o caso que estamos a tratar é a TAP. O que se passa é imoral. Não, não se trata de nivelar por baixo nem de atentar contra direitos adquiridos (se calhar mal adquiridos). Trata-se de pôr as coisas no são e de estabelecer justiça relativa. O mesmo patrão, deve tratar todos os seus servidores e empregados de modo equitativo. E se por acaso quiser tratar alguém melhor, esses seriam indubitavelmente os militares, por razões que me dispenso de enumerar, para não ofender a inteligência dos leitores;
2 - por outro lado as FAs deviam, através do MDN – para isto é que ele existe -, procurar um entendimento com as empresas públicas e até eventualmente com privadas, porque não?!, para aceitarem um número limitado de pilotos que atingissem um determinado número de anos de serviço, o que permitiria uma “saída por cima”, racionalização das promoções e melhoria da gestão de pessoal. Para as companhias civis seria um benefício por terem a garantia de receberem pilotos experientes sem terem gasto um cêntimo de investimento;
3 - se criar  uma espécie de reserva activa para pilotos, em moldes a estudar, o que permitiria que pilotos a voarem em companhias civis pudessem manter qualificações em aviões militares e deste modo reforçar o potencial disponível das FAs, no seu dia a dia e em caso de crise ou guerra;
4 - se manter nas fileiras um Moral elevado, este é o assunto que mais deveria preocupar as chefias militares. Manter um moral elevado é um assunto de sempre do comando militar e passa por atender a um conjunto intrincado de questões e situações como são a consciência da importância da missão, a aderência a um conjunto de regras e valores; a confiança nos chefes e na instituição; a realização pessoal; o patriotismo, a defesa institucional, o reconhecimento público, etc. Ora se tal não se passar, podem pagar milhões, que as coisas não ficam bem. E, claro, deixamos de ter militares para ter mercenários;
5 - finalmente, é fundamental estancar a depreciação social dos militares e a desvalorização da condição militar.
Sem embargo de ser um assunto que ultrapassa largamente as FAs, estas não se podem alhear de terem um papel importante na sua resolução e não se limitarem a tentarem bem cumprir as suas missões com os escassos meios que lhe são atribuídos e a servirem de saco de levar pancada. Já chega!
 Insistir em resolver os problemas do modo usado até agora, é pensar com a cabeça sim, mas … dos pés! É preciso ter imaginação e espinha.
            Mouzinho sabia do que falava, mas quem é que o lê hoje em dia?

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